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Termos do discurso pós-colonial do inglês

Canibal  

A deslocalização de antropofagia para canibalismo realiza um movimento discursivo da antropologia para o imperialismo. Se o canibalismo transgressivo (de origem patológica) e de sobrevivência (incluindo na Europa em tempos de escassez agrícola, catástrofe natural e guerra) é/era reconhecido, a introdução do termo canibal permitiu remeter o Outro para o reino do primitivismo e consequentemente fundamentar a sua sub-humanização e até demonização. Tratou-se portanto de uma manifestação de ansiedade colonial e de uma manobra primordial de reforço e manutenção de um princípio civilizacional apenas possível através da transferência de um sentido de abjecção.

Contra-pontualidade  

Em Culture and Imperialism (1993) Edward Said introduz o conceito para se referir ao tipo de análise que revela como os textos constroem tacitamente o imperialismo e justificam o colonialismo. O termo é emprestado do campo musical para expressar um tipo de leitura reactiva que desvenda as marcas coloniais presentes mas que precisam de ser trazidas à atenção. Esta leitura representa portanto um contraponto. Tal como Said demonstra com Mansfield Park (1814) de Jane Austen, a construção de um modelo de anglicidade depende da exploração de mão-de-obra escrava nas Índias Ocidentais, embora a questão seja textualmente silenciada. O conhecimento contrapontualístico oferece resistência aos sistemas de conhecimento universalizantes do eurocentrismo. A ideia de contra-pontualidade pretende extrair várias tematizações da mesma “nota”/texto e dramatizar o projecto imperialista e a sua interlocução como um processo continuado que liga o presente com o passado e o futuro.      

Mimetismo   No campo dos Estudos Pós-Coloniais o termo é introduzido por Homi Bhabha para descrever as relações marcadas por profunda ambivalência entre colonizador e colonizado. Por acção institucional e discursiva, o colonizado é incentivado a mimetizar o colonizador em termos de comportamentos sociais, valores, religião, língua e demais marcadores culturais. O efeito desta imitação é, contudo, imperfeito considerando que o mímico não chega à situação como tabula rasa. Se por um lado a reprodução defectiva representa a impossibilidade de domínio absoluto, pode encontrar também nessa diferença um local de resistência. O carácter da relação estabelecida é, portanto, ambivalente. Na expressão que emblematiza o próprio mimetismo, Bhabha afirma que o colonizador é reproduzido como quase o mesmo, mas não exactamente. No contexto colonial, o mote de Bhabha é concretizado mais concretamente como quase o mesmo, mas não branco.
Caliban e Prospero  

Caliban e Próspero são personagens de A Tempestade (1610-1611) de William Shakespeare que têm sido usadas na crítica pós-colonial para simbolizar o binómio do colonizado e do colonizador. Numa leitura colonial, Caliban encarna a figura do nativo incapaz de assimilar a educação “superior” que lhe é oferecida. Por oposição, Próspero representa a superioridade da civilização ocidental que, pela sua aventura imperialista, torna acessível a outros povos. Numa leitura crítica pós-colonial, contudo, Caliban é visto como o nativo cuja cultura é subjugada, é oprimido, escravizado e despojado das suas terras. Próspero é o colonizador eurocêntrico, manipulador e arrogante. Mas uma abordagem crítica mais alargada reconhece a falácia do maniqueísmo simples e criadora de estereótipos. O processo colonial, tal como Frantz Fanon, Albert Memmi e Homi Bhabha destacam, é necessariamente marcado pela ambivalência, hibridez e interdependência.

Literaturas aborígenes/indígenas  

Terminologicamente falando, o sentido original do substantivo e do adjectivo “aborígene” é indígena. O termo referia-se aos povos indígenas aos lugares que eram “descobertos” no percurso da expansão europeia, principalmente em contexto de colonização de povoamento. Na actualidade o termo sem outros complementos remete para os aborígenes australianos. Porém, o termo “aborígene” ao ser cunhado pelos colonos invasores e usado pelas gerações que se lhes seguiram, adquiriu um sentido negativo pelo que as formas que indicam a especificidade étnico-cultural são preferenciais.

No século XX assistiu-se ao surgimento da literatura aborígene em língua inglesa a qual exprimia a história recente desse povo marcada pela desapropriação da terra, problemas sociais, e afirmação étnica intimamente ligada à cosmogonia do Tempo do Sonho. David Unaipon é considerado o primeiro autor de literatura aborígene com as publicações Hungarrda (1927), Kinie Ger—The Native Cat (1928) e o seu mais famoso livreto Native Legends (1929). A primeira obra por uma autora aborígene é de Ursula McConnel, Myths of the Munkan (1957). O género autobiográfico ou derivado é característico de muitas publicações, área onde a presença feminina se destaca.

 

Carnaval  

Mikhail Bakhtin é o teórico de referência do carnaval e do carnavalesco nos Estudos Culturais da actualidade. Bakhtin salientou como manifestações principais deste espírito que se evidenciou sobretudo na Idade Média os espectáculos rituais, as composições cómicas verbais e formas de abuso. A formulação bakhtiniana adquiriu centralidade junto da crítica pós-colonial já que se debruçava sobre a construção do poder e das várias formas da sua subversão. Está ligada intrinsecamente à questão da liberdade e à suspensão nas normas do status quo, ainda que dentro de um contexto temporal limitado. A transgressão é realizada através do riso e frequentemente derivada de elementos grotescos pelo que Bakhtin se refere à veia como o carnavalesco-grotesco. Os três vectores do riso são a universalidade, liberdade e a expressão da verdade oficiosa do povo.

Ab-rogação  

Ab-rogação emerge estritamente de um contexto linguístico na medida em que representa a rejeição do conceito de língua (inglesa ou outra) no sentido normativo, ou seja, abandona o princípio de correcção linguística pura. Subjacente ao termo ab-rogação está a negação da inferioridade linguístico-cultural de dialectos ou variantes marginais.

Ghazal  

O ghazal é uma das formas maiores da poesia islâmica do Médio Oriente e o vocábulo deriva do árabe que significa “falar com” ou “falar de mulheres”. É composto por dísticos rimados independentes em termos de conteúdo, seguidos de refrão. Carlos Ceia aponta a sua origem para a Pérsia do final do século VII embora possa ser ainda mais antigo ( http://www2.fcsh. unl.pt/edtl/verbetes/G/ghazal.htm). As temáticas destas composições curtas são tradicionalmente a paixão (geralmente ilícita ou inalcançável) e os prazeres do vinho. Com a expansão para a Ásia Meridional no século XII e a influência do misticismo sufi, o ghazal expressa também o amor pelo divino, uma forma de elevação e o júbilo da alma do poeta. As línguas de produção são o urdu, o hindi, o turco, o curdo, o caxemirense, o gujarati e o árabe embora formas modernas utilizem o inglês apesar desta alteração linguística ser combatida pela facção mais tradicionalista. Adrienne Rich e Phyllis Webb têm vindo a publicar ghazals originais em inglês. O maior impulsionador terá sido no entanto provavelmente Agha Shahid Ali que se radicou nos Estados Unidos. “Ghazel”, “gasal” e “gazel” são formas ortográficas alternativas.

Butling, Pauline ed. Seeing in the Dark: The Poetry of Phyllis Webb. Waterloo, Ontario: Wilfrid Laurier UP, 1997

Alteridade  
Gandhismo  

O movimento social e cívico iniciado por Mahatma Gandhi levou à produção de uma vasta quantidade de textos defendendo os seus princípios ou com eles concomitantes. Entre eles estão os seus ensinamentos de desobediência civil não-violenta que levou à retirada dos britânicos do território britânico e a promoção do desmantelamento do sistema hindu de castas que mantém milhões de indianos socialmente agrilhoados à pobreza extrema. O impacto gandhista em outros movimentos pacifistas internacionalizou o gandhismo, por exemplo, nos Estados Unidos com Martin Luther King e o Movimento Americano dos Direitos Civis e na África do Sul com Nelson Mandela. 

Apartheid  

Termo africânder cujo sentido literal é “separação”. Ficou infamemente ligado à política separatista sul-africana implementada no país em 1948 pelo Governo do Partido Nacionalista. Ganha expressão legal em 1948 com a tomada de posse governamental dos africânders cujas políticas visavam não só a limitação do acesso à terra mas também à educação, liberdades civis e direitos fundamentais como o emprego e assistência médica. A necessidade de proximidade de mão-de-obra negra barata que contribuísse para a manutenção dos benefícios gozados pela comunidade branca levou ao apuramento da segregação racial por áreas ligada ao Group Areas Act. Com esse fim em vista, surgiram complexos demográficos com habitações de baixo custo. A política segregativa reflectia-se em todos os campos da vida social sul-africana determinando o lugar que cada um ocupava nas praias, hospitais, transportes públicos, e instituições de educação. Outra manobra eficiente foi a promulgação de várias Pass Laws (Leis dos Passes) que obrigava todos os não-brancos a serem portadores de passes identificativos que limitavam o seu acesso às áreas privilegiadas brancas, excepto se tivessem licenças de trabalho. De modo a que estes decretos fossem aplicados, houve necessidade de classificar as “raças” como Negra, de Cor, Indiana ou Branca. A ficção representada por estas classificações estava bem patente na constante necessidade de a rever ainda que uma constante se mantivesse: a “raça” branca estava sempre no topo.

O apartheid constituiu o regime político na África do Sul de 1948 até 1994, atingindo o seu apogeu durante os anos 60, período que ficou conhecido como Grand Apartheid, o Grande Apartheid. O regime foi inevitavelmente combatido com revoltas violentas. Em 1960 em Sharpeville, 69 manifestantes foram mortos por acção policial. Na sequência foi declarado o estado de emergência, o ANC (o partido African National Congress / Congresso Nacional Africano) foi banido e registaram-se milhares de detenções, entre elas a de Nelson Mandela que permaneceu prisioneiro em Robben Island durante 27 anos.

A acção sobre a educação operou ao nível não só da possibilidade de assimilar as condições desumanas do dia-a-dia do/a negro/a africano/a e dos sentidos emocionais gerados na psique do indivíduo, mas ainda da própria possibilidade criativa de produzir esses textos. O programa escolar era constituído, de facto, por um corpus europeu. Wally Mongane Serote, , Sydney Sipho Sepamla, Nise Malange e Mzwakhe Mbuti incitavam nas suas publicações à resistência. Miriam Tlali de modo muito relevante publicou Muriel at the Metropolitan (1975), o primeiro romance sul-africano de uma mulher negra, Amandla, A Novel (1980) e Soweto Stories (1989).

A situação para os escritores brancos poderia também ser delicada caso tomassem igualmente uma posição de denúncia. A esse grupo pertenciam Nadine Gordimer, Athol Fugard, J. M. Coetzee e André Brink.

A situação das mulheres negras sul-africanas envolvia dificuldades acrescidas no que diz respeito à educação. Por norma, as tarefas reservadas socialmente às mulheres eram consideradas prioritárias, deixando pouco tempo disponível quer para uma educação formal quer para a escrita ou mesmo leitura recreativa. Por outro lado, as mulheres, vistas como categoria, eram ainda mais empobrecidas. Construir textos politicamente engajados colocava as suas vidas em perigo, de modo que as autoras por vezes optavam pelo exílio ou exílio em trânsito, como fez Bessie Head, Lauretta Ngcobo, Farisa Karodia e Sheila Fugard, esposa de Athol Fugard.

Nos anos 80, a África do Sul denotava os efeitos da pressão internacional e da acção interna que levaram ao desmantelamento do apartheid. Finalmente em 1990, Mandela é libertado e assume a liderança do ANC. Progressivamente, entre 1991 e 1994, as leis apartheidistas são revogadas sob a liderança do presidente F.W. de Klerk. Em 1994 o ANC ganha a maioria. Se na era apartheid a ficção de protesto era predominante, a literatura pós-apartheid denota uma diversificação de temas, desconstruindo o binarismo derivado da oposição directa de um grupo sobre o outro. No seu conjunto, a literatura produzida nos últimos anos revela preocupações com o dilema da urbanização (modernização) versus tradição, a mobilização pessoal, migratória ou de exílio, o crime urbano, o incremento da pobreza, a problematização racial complexificada e o esquadrinhamento dos grupos carecidos como as mulheres e os homossexuais. A literatura recente sul-africana já não identifica portanto como o seu objecto de referência o Outro Branco.    

'Tornar-se nativo'  

Por detrás deste termo encontra-se a dicotomia criada pelo processo cultural de colonização através do qual se constrói um povo “civilizado” por oposição a “selvagem”, logo inferior. O termo expressa o receio do colonizador de ser individualmente contaminado pelos modos dos nativos, cujas sociedades considerava “primitivas”. A natureza da contaminação varia mas frequentemente é combinatória: racial, sexual e moral. Numa acepção complementar do termo, tornar-se nativo exprime a adopção casual de costumes nativos.

Apropriação  

Apropriação é fundamental para a teoria e crítica pós-coloniais pois descreve os modos como as sociedades pós-coloniais tomaram para si as variadas formas da cultura imperial. Formas como a língua, actividades artísticas e inclusive modos de estruturação intelectual e social podem ser apropriados para, ao invés, servirem para reforçar as identidades culturais locais.

Grupo dos Sete  

Grupo constituído por Franklin Carmichael, A. Y. Jackson, Frank Johnston, Frederick Varley, Arthur Lismer, J. E. H. MacDonald e Lawren Harris. Formados em 1919, este grupo de pintores canadianos fez a sua primeira exposição em 1920. O objectivo da sua escola era promover um estilo nacionalista de pintura. Encontraram na paisagem de Algonquin Park e Georgian Bay, na região do Ontário, um tipo de beleza distintamente canadiana. O grupo acabou como tal em 1933 e surgiu reformado como o Canadian School of Painters, permitindo a inclusão de um grupo mais alargado de artistas.

Autenticidade  

Na sequência dos movimentos descolonizadores, iniciou-se o debate sobre a “autenticidade” das culturas invadidas. Num momento inicial, assistiu-se a sentimentos de erradicação de quaisquer elementos derivados ou relacionados com a colonização, considerados inautênticos, por oposição a um espírito autêntico, traduzido em crenças e costumes pré-coloniais. Esta posição pode facilmente tornar-se extremada e mesmo utópica ao objectivar a identificação e recuperação de um elemento cuja qualidade terá sido moldada pela memória em tempos de trauma colonial. Para além do mais, aproxima-se de uma postura essencialista que, pela mesma razão, valoriza as práticas consideradas exclusivamente indígenas. As formas culturais hibridizadas herdam componentes derivados da presença invasiva e, por tal, são encaradas como contaminadas pela experiência colonial que se pretende agora, por seu turno, reprimir. O princípio da autenticidade reinscreve as comunidades pós-coloniais através de padrões hierarquizantes, ou seja, deslegitimando o (mais ou menos) recém-chegado em favor do tribal, local e tradicional, sem os questionar.

Literatura dalit  

Ciente da correlação entre terminologia e políticas ideológicas, Mahatma Gandhi adoptou o termo “harijan” para substituir a designação “intocável”. Segundo a filosofia e prática social hindus, os “intocáveis” dão literalmente corpo à impureza por terem violado os códigos religiosos em vidas anteriores. Para manter a imaculabilidade das outras castas, os “intocáveis” devem ser mantidos à parte em todos os aspectos da interacção social e ritual. Esta crença deu origem a uma estrutura social na qual os “intocáveis” sofrem de discriminações graves nomeadamente aos níveis de contacto físico com membros de outras castas, de tabus matrimoniais e de consignação a trabalhos abjectos e humilhantes, considerados indignos para elementos de qualquer outra casta. A adopção do termo “harijan”, que significa “filho de Deus” visava a extirpação do paradigma discriminatório. “Dalit”, que significa “oprimido” ou “derrotado”, surgiu como termo marati e hindi equivalente ao que os britânicos designavam de “classes deprimidas”. B. R. Ambedkar popularizou o termo dalit por considerar que “harijan” não contribuía para a dignificação do grupo. Recentemente assistimos à emergência da literatura e estudos dalit como movimento consciente de si próprio. Por literatura dalit entende-se o conjunto de textos de e sobre dalits. Da lista de autores constam escritores e activistas da Ásia Meridional como Mulk Raj Anan, Mahasweta Devi, Namdeo Dhasal, Daya Pawar, Arjun Dangle, Manghal Rathod, Perumal Murugan e Vasant Moon cuja autobiografia Vasti, é primeira de um dalit a ser publicada na Índia e a ser traduzida para inglês em 2002 como Growing up Untouchable in India: A Dalit Autobiography. O objectivo da literatura dalit é demarcado: apelo à afirmação, protesto e mobilização dos dalit, frequentemente pela denúncia dos abusos veiculados pelo hinduísmo. As temáticas reflectem este objectivo: mágoa, angústia, raiva e revolução.

Cafrealização  

No século XIX, o termo descreve a desvinculação dos Portugueses em relação à sua portugalidade e à noção de cultura civilizacionalmente superior. Os portugueses, menos dados ao estigma da miscigenação que outros colonizadores, constituíram famílias africanas, adoptando os modos de vida e as línguas das suas novas comunidades. Mas a mudança de mentalidade em relação ao que definia globalmente um império levou a que cafre passasse a descrever o negro nas linhas do “selvagem” e do “primitivo”. A descrição de um português como cafre tinha, logicamente, intenções injuriosas.

Renascença do Harlem  

Nos anos de 1920 surgiu um movimento cultural e literário em Harlem, Nova Iorque, que ficou conhecido como Renascença de Harlem. Fruto de um movimento migratório das zonas mais rurais do país, vários artistas destacam-se com publicações como Home to Harlem (1928) de Claude McKay. Outros exemplos são Jean Toomer, Zora Neale Hurston, James Weldon Johnson, Langston Hughes e Alain Locke. Trabalhos desta índole deram expressão à condição do afro-americano e à sua negociação da presente circunstância urbana com as origens caribenhas e africanas. Assumiam uma estética própria, distinta dos cânones brancos, que celebrava a criatividade e expressões artísticas negras. A consciencialização e visibilidade textual da diáspora negra alicerçaram o sentimento de orgulho afro-americano que se manifestou política e culturalmente em movimentos como a Negritude, os Direitos Civis Americanos, o Pan-Africanismo e os próprios Estudos Pós-Coloniais. De entre esses textos o jazz, blues e géneros musicais correlativos foram da maior importância. Os clubes nocturnos como o Savoy Ballroom, o Cotton Club e o Apollo Theater eram imensamente populares com as actuações de Dizzy Gillespie, Ella Fitzgerald, Billie Holiday, Duke Ellington, Louis Armstrong e Josephine Baker.

Catacrese  

Catacrese é um termo de origem grega emprestado dos Estudos Literários indicando um uso inadequado. Catacrese é utilizado por Gayatri Spivak como termo aproximado de apropriação no contexto em que determinado elemento é utilizado e reinscrito pelo colonizador, sendo originalmente parte da cultura imperialista.

Santa Trindade  

Dado o impacto dos seus estudos e teorias, Gayatri Chakravorty Spivak, Homi K. Bhabha e Edward Said foram denominados conjuntamente por Robert Young de Santa Trindade. 

Cromatismo   O termo descreve a perspectiva essencialista que detecta e justifica distinções humanas de acordo com critérios de cor de pele.
Pátrias Imaginárias   Pátrias imaginárias: Ensaios e textos críticos, 1981-1991 é o título da colecção ensaística de Salman Rusdie que marcou indelevelmente os Estudos Literários Pós-Coloniais. Com o mote do seu retorno à então denominada Bombaim (actual Mumbai), a sua cidade natal, Rushdie introduz a tese de que a cidade e o seu passado precisam de ser resgatados pois é aí que encontra a sua pátria. Sendo o passado como um espelho partido, a memória é capaz de recuperar apenas alguns dos fragmentos, razão pela qual a imaginação reorganiza o passado e as falhas são preenchidas pela imaginação.
Descolonização   No âmbito dos Estudos Pós-Coloniais Literários e Culturais, descolonização tem um sentido mais alargado do que o momento histórico relacionado com a retirada das potências coloniais e a obtenção de independência por parte das nações ocupadas. No contexto em questão, descolonização define o processo pelo qual se denuncia os aspectos abafados da colonização e se inicia o seu desmantelamento. Frequentemente associados a movimentos de resistência e de anti-colonialismo, a descolonização verifica-se a nível político, económico e cultural. Na actualidade verificamos a relevância do fenómeno da globalização para as questões da neo-colonialidade, já que o modelo de economia mundial condiciona/renova modos de controlo económico sobre nações previamente ocupadas. O poder económico que a classe compradora exerce está intimamente associado ao controlo social e cultural realizável através de práticas educacionais eurocêntricas e discriminações internas. A realidade da persistência da lógica da hegemonia pela via económica tem determinado a continuação da valorização de modelos ocidentais, pelo que os objectivos da descolonização se centram na resistência pela promoção de elementos indígenas. Os programas de descolonização consagram-se às línguas nativas, à oralidade/oratura, e a formas culturais não-escritas como a dança e artes pictóricas e performativas.
Mosaico   Este termo surgiu em debates canadianos sobre a nação. Pretendia simbolizar um paradigma social em que indivíduos e grupos de diferentes identidades étnicas e culturais colaboram para constituir um corpo nacional comum, mantendo no processo as qualidades que lhes são próprias.
Dependência (teoria de)   A teoria da dependência emerge de um contexto crítico marxista o qual encontra no capitalismo global a razão da continuada pobreza em nações previamente colonizadas e, na sua maioria, marcadas com o rótulo de terceiro-mundistas. Os mecanismos de exploração económica implementados pelo sistema colonial continuam a verificar-se, nomeadamente ao reforçarem o papel dessas nações como produtoras de matérias-primas e de alimentos que abastecem centros industrializados no Ocidente. A filosofia decorreu da análise de um contexto geopolítico específico, a América Latina dos anos de 1960 e 1970, altura em que intelectuais como Ruy Mauro Marini, Theotonio dos Santos, Fernando Henrique Cardoso, Vânia Bambirra, Orlando Caputo, Roberto Pizarro e Andre Gunder Frank contestaram o princípio de que o desenvolvimento económico é um processo gradual mas ascendente; trazendo a questão histórica e especificamente o fenómeno imperialista para a equação, tornou-se claro que forças renovadas de dominação continuavam a impedir o crescimento da América Latina. Ao ter-se em conta o factor do imperialismo a ideia da falta de capacidade das nações subdesenvolvidas revela-se bastante mais complexa. Frank, em particular, aponta para a estrutura e função do sistema mundial, desmistificando ideias de factores internos.
Língua-Nação  

Considerando o contexto linguístico das Caraíbas, Edward Kamau Brathwaite cunhou o termo para se referir às variedades específicas dessa geografia. Salientando a forte influência africana na herança cultural da região, Brathwaite argumenta que embora as estruturas lexicais da língua inglesa possam ser preservadas na língua-nação, nos seus contornos, timbres e explosões sonoras distanciam-se dela. De facto, a língua-nação apoia-se fortemente nos textos orais, nomeadamente na poesia, e incorpora os complementos típicos dessa forma de comunicação, tais como são o canto e os mais variados tipos de som. Também estes elementos contribuem efectivamente para a construção dos significados.

Diáspora  

A dispersão de povos de um local onde estão instalados para novos territórios é denominada de diáspora. Etimologicamente, a origem do termo é grega: dia (através de) e sperien (semear ou espalhar sementes). Pela prototípica diáspora judaica se pode verificar como a diáspora surge associada a impulsos colonizadores, usualmente em relação de causa/efeito. Mas na experiência dos imperialismos das nações europeias, são os europeus que por vontade própria deixam as suas pátrias para se estabelecerem por longos períodos ou mesmo permanentemente noutros territórios. No processo, dão início a outras diásporas, de natureza forçada, nomeadamente o movimento migratório esclavagista afrospórico, ou seja, a diáspora negra para as Américas. O sentido da experiência histórica negra é portanto o entendimento dela como processo cultural de diaspora-ização. Porém, o termo reserva uma ambiguidade positiva já que se por um lado se refere a deslocações forçadas muitas vezes derivadas dos efeitos da máquina colonialista, por outro remete para a disseminação cultural. Os sujeitos diaspóricos são caracterizados pela hibridez e diversidade, percorrendo transversalmente territórios culturais e saltando fronteiras que demarcam nações. A literatura da diáspora portuguesa tem-se manifestado com produções variadas. Os seus autores fazem parte do que Onésimo Teotónio Almeida tão perspicazmente denominou de L(USA)lândia para se referir às comunidades portuguesas nos Estados Unidos, que no seu todo formam um “país” culturalmente híbrido de luso-americanos e imigrantes portugueses.

Bom Selvagem  

Jean Jacques Rousseau aparece como o autor que difundiu o conceito da suposta inocência dos povos “primitivos”. Como noção estereotipada do Iluminismo europeu, permitia diferenciar as sociedades e culturas do Velho Mundo como pilares da civilização, opostamente distintas do “estado natural” de povos encontrados durante a aventura expansionista, encarados precisamente como representativos de uma condição pré-civilizacional. No contexto das Américas, o termo adquiriu valores semânticos adicionais passando a ser conectado com a inocência paradisíaca da Natureza não-contaminada. O conceito é uma idealização redutora das virtudes dos povos indígenas, materializando uma construção essencialista de alteridade.

Imperialismo ecológico  

Em 1986 Alfred W. Crosby analisa no seu livro Ecological Imperialism: The Biological Expansion of Europe, 900-1900 o impacto que o ambiente dos territórios colonizados sofreu na sequência desse mesmo processo colonizador. A premissa de Crosby é que para além das consequências socio-culturais, teve lugar um efeito no ambiente natural que estava directamente ligado aos modos de subsistência e organização comunal de determinados povos. O seu argumento é que a componente biológica e ecológica foi decisiva para o êxito da missão imperialista, nomeadamente no que diz respeito às doenças que partiram da Europa em direcção às colónias, por vezes sendo mesmo introduzidas deliberadamente. A destruição do pecúlio ecológico através de uma acção assaz agressiva foi terrivelmente prejudicial aos povos indígenas, acentuando o genocídio iniciado por via militar.

Pan-Africanismo  

Pan-africanismo designa a crença colectiva de um espírito unificador de todos os africanos e dos seus descendentes espalhados pelo mundo por motivos de diásporas forçadas. O pan-africanismo ganhou particular expressão com o despertar das resistências independentistas em África, às quais se associou. Com este objectivo conseguido, o pan-africanismo luta ainda por objectivos como o fim da hegemonia branca em algumas nações e o contínuo combate às novas formas de subjugação imperial que mantêm o continente africano empobrecido. A ideologia pan-africanista reclama ideais de solidariedade racial comuns a uma nação sem fronteiras, de cultura e subjectividade partilhadas. Celebra ainda a condição negra, nomeadamente africana, como forma de ser cultural e racialmente distinta. Líderes intelectuais e políticos associados ao pan-africanismo incluem Marcus Garvey, Bob Marley, Malcolm X, George Padmore, Kwame Nkrumah e Anton Lembede. 

Eurocentrismo  

A colocação da Europa e da sua construção de valores no áxis do mundo, pressupondo-os como padrão e universais. Com a expansão marítima, o contacto com novos povos levou à confrontação com valores distintos. A conquista dos seus territórios e a exploração dos seus recursos literalmente humanos e naturais justificava-se precisamente pela pressuposição da superioridade desses valores. A cartografia da época reflectia, portanto, tanto um mapeamento material como mitológico e ideológico.

Os Estudos Pós-Coloniais estão, portanto, interessados em investigar modos de representação eurocentristas e na sua subsequente desconstrução. Por tal, Graham Huggan propõe descolonizar o mapa. Se em textos pós-coloniais contemporâneos o topos do mapa ainda é amplamente usado, é-o de um modo revisionista, de/reconstrutivo, irónico ou paródico. Estes textos oferecem resistência ao hermetismo cartográfico eurocêntrico e realizam, ao invés, uma forma de descolonização/descentralização cultural (1995: 407-411).

 

Huggan, Graham. “Decolonizing the Map”. The Post-Colonial Studies Reader. Ed Bill Ashcroft, Gareth Griffiths e Helen Tiffin. Londres e Nova Iorque: Routledge, 1995. 407-411

 

Gótico pós-colonial  

O termo surge da convergência de características comuns de um determinado tipo de literatura contemporânea e de uma estética ficcional que floresceu desde a década de 60 do século XVIII e que com modulações ainda subsiste nos nossos dias. O surgimento de literatura pós-colonial gótica emerge na confluência das teorias comuns que destacam o processo de alterização, excluindo e destruindo, ou reconhecendo as ricas influências do Outro que é construído de modo a iluminarmos ou tornarmos mais seguras as nossas formações identitárias quer sejam elas individuais ou nacionais. Este encontro aparentemente improvável ocorre pelo sentido partilhado em desestabilizar e interrogar. A literatura pós-colonial problematiza formulações de história, a vigência de valores chegados através de culturas extemporâneas e construções sociais realizadas através de instrumentos culturais e institucionais imperialistas. A literatura pós-colonial é, portanto, na sua génese, desafiadora e perturbadora. Do mesmo modo, o gótico rejeitava os preceitos do racionalismo iluminista, das certezas e das morais inquestionáveis através de elementos distintivos de criação de atmosferas de terror: desde componentes fantasmagóricos a maldições de família, ambientes medievais e de ruína, criaturas fantásticas e paixões irreprimíveis.

Exótico   Originalmente com o sentido de algo/alguém externo ou estrangeiro, o termo adquire contornos próprios no discurso imperialista. No auge do império britânico, “exótico” passa a ser conotado com sentidos de diferença excitante oriunda de territórios colonizados e inerente à “natureza” de certos povos indígenas assim como dos seus costumes. Essa diferença era domesticada e higienizada de modo a torná-la segura para manuseamento dos cidadãos no centro imperial. Edward Said teorizou especificamente o assunto através do conceito relacionado de Orientalismo (1978), texto fundador dos Estudos Pós-Coloniais. Outro contributo importante na discussão do exótico é o de Graham Huggan, The Postcolonial Exotic (2001), no qual o autor denuncia a cumplicidade dos próprios Estudos Pós-Coloniais. Huggan alega que as literaturas e as culturas pós-coloniais conheceram um crescimento exponencial associado à exotização das mesmas. As suas materializações tornaram-se produtos num universo mercantilista fundado nos alicerces da globalização.
Terra Nullius  

Geralmente utilizado no contexto da expansão para a Austrália, Nova Zelândia e América do Norte, o termo refere-se no entanto à noção que encarava o território a que os europeus chegavam como vazio, deste modo justificando a despossessão das comunidades indígenas. Não partilhando do mesmo princípio “civilizacional”, a estas comunidades não era reconhecido o direito às terras e, consequentemente, estas eram tidas como não reclamadas. Em certos casos as terras foram literalmente tornadas vazias de população indígena através de acções genocidas.

Fanonismo  

A influência da obra de Frantz Fanon, particularmente de Peau noire, masques blancs de 1952 (Black Skin, White Masks, 1968) e de Les damnés de la terre de 1961 (The Wretched of the Earth, 1963), deu origem a uma crítica a que nos referimos como fanonismo. Nascido na Martinica, pôde pelo exercício da sua profissão como psiquiatra fazer reflexões de natureza psicológica, sociológica e antropológica sobre a matéria. Partindo de dados recolhidos no processo de análise clínica, Fanon concluiu que a subjugação colonial se processava através de complexas estratégias psicológicas que se repercutiam nas psiques dos próprios colonizados. Baseando-se numa lógica Marxista, ele formulou a concepção da classe de comprador, ou seja, de uma elite social e económica, cujos interesses se identificavam com as estruturas institucionais da cultura branca dominante e que, portanto, não se empenhava com a ideia de transformação social. A metáfora que dá título à sua obra de 1952, reflecte o seu pensamento-chave de que a cor da pele desta classe negra escondia, isto é, mascarava a sua cumplicidade com o poder colonialista branco.

Literatura de viagens  

 

A literatura de viagens baseia-se na observação empírica do real cujo impulso é, directa ou indirectamente, a procura do estranho, do desconhecido ou do exótico. Existe portanto um preceito material, isto é, uma viagem literal a qual, ainda que possa dar origem a viagens metafóricas, é apreendida por um olhar físico. A literatura de viagens no caso português tem uma tradição antiga e ficou substancialmente associada ao movimento expansionista e ao imperialismo. Derivado de um ímpeto pragmático, o registo de dados relacionados com a navegação, como sejam os de ordem climatérica mas também topográfica, materializou-se em roteiros e diários de bordo que incluíam ainda impressões dos seus autores acerca da própria experiência da viagem. Com o declínio do movimento das “descobertas” propriamente ditas, a tradição esmoreceu, pelo que nos séculos seguintes apareceram apenas casos pontuais, quase sempre tendo como referência esse momento encarado como áureo de Portugal. A literatura de viagens portuguesa não parece ter encontrado um roteiro alternativo para se desenvolver.

 As literaturas de viagens de qualquer nação expansionista denotavam interesse na descrição dos elementos climatéricos, ambientais e humanos, mas estas observações eram apresentadas ao serviço de uma missão imperialista civilizacional. Pela categorização de outros mundos como estranhos, selvagens e/ou “exóticos” acentua-se a justeza da presença europeia e da sua dominação.

Em termos da crítica pós-colonial, Edward Said introduz em 1982 o conceito relacionado de teoria em viagem. O termo de Said descreve o princípio que as teorias – a organização sistematizada de ideias – viajam de sujeito para sujeito, situação para situação e de época para época. As teorias respondem, portanto, a necessidades contextuais específicas (1982: 226). Contudo, essas viagens acarretam perigos, já que no processo a sua índole reivindicativa pode ser perdida pela domesticação e deshistorização da academia. Apropriada, acomodada e incorporada, uma determinada teoria é transformada pelos novos usos que lhe são dados (1982: 227). Ao entrar na corrente cultural com sucesso, torna-se provável que durante as suas peregrinações, a teoria seja reduzida, codificada e institucionalizada (1982: 239).

 

Edward Said. “Traveling Theory”. The World, the Text, the Critic. Cambridge, Mass.: Harvard UP, 1983

Filiação/afiliação  

Em The World, The Text, and The Critic (1983) Edward Said destrinça dois modos da prática literária se comportar em relação à tradição. Nas sociedades ocidentais o carácter das relações é filial mas é disputado pelas afiliações ou identificações culturais. Portanto, se as relações filiativas são do domínio da natureza, as relações do tipo afiliativo pertencem ao domínio da cultura (1983: 20). A dicotomia tornou-se útil nas discussões sobre matérias de interesse (pós-) colonial, já que a relação entre sujeito colonizado e colonizador encontra um paralelo com filho e pai. A relação literária com os cânones é do tipo filiativo mas tem tendência a ser contestada por relações afiliativas nos textos literários pós-coloniais. O favorecimento afiliativo permite à/ao crítica/o ir além da perspectiva potencialmente míope da filiação, pois precisa de considerar o texto no contexto do mundo que o produziu (1983: 174-175); as relações literárias per se só podem fornecer uma leitura parcial. Numa outra acepção, no contexto imperialista, afiliação descreve também a adopção dos valores da força colonizadora em detrimento dos elementos culturais locais.

Said, Edward. The World, The Text, and The Critic. Harvard: Harvard UP, 1983

 

Tricontinentalismo  

O termo “Terceiro Mundo” tem gerado alguns desconfortos no discurso pós-colonial na medida em que confina um conjunto de países a um lugar desvantajoso na hierarquia política e social estabelecida pelo ocidente. O termo tricontinentalismo surgiu como tentativa de retirar esses países do universo da estigmatização reforçada pelo termo “Terceiro Mundo”. Em 1966 uma conferência de nações dos três continentes do hemisfério sul (África, Ásia e América Latina) em Havana institucionalizou o termo tricontinentalismo. Nela participaram Frantz Fanon, Ho Chi Mihn, Jean-Paul Sartre, Amílcar Cabral e Che Guevara. É evidente o cunho de esquerda do termo por oposição ao teor neo-imperialista de “Terceiro Mundo” que actualmente, quando o imperialismo se reinventa pela exploração capitalista de recursos humanos e materiais, adquire especial relevância. Che Guevara assumiu um papel central na defesa da ideologia tricontinental pela denúncia de toda a forma de colonialismos e da emergência do imperialismo norte-americano (materializada nas várias intervenções militares na América Latina e Vietname). Contra forças tão esmagadoras, apelou não só à solidariedade pelos povos explorados de África (incluindo as colónias portuguesas), Ásia e América Latina, mas também a um verdadeiro internacionalismo proletário (Young 2001: 204-216).

Lusotropicalismo  

O conceito de lusotropicalismo é formulado pelo historiador Gilberto Freyre para identificar o que considerava a singularidade da colonização portuguesa, fruto da hibridez africana e europeia que caracteriza a própria portugalidade. As características distintivas do lusotropicalismo são, numa perspectiva gilbertiana, a miscigenação, a comunhão cultural e o não-racismo. O lusotropicalismo tem sido usado como discurso definidor de uma identidade portuguesa saudosista e imperial, recuperando mitos nacionais que remontam ao Quinto Império. A sua utilidade política foi particularmente aproveitada pelo Estado Novo, regime sob o qual António de Oliveira Salazar definiu o lusotropicalismo como “o modo português de estar no mundo”.

 

Freyre, Gilberto. Casa-Grande & Senzala. São Paulo: Global Editora, [1933] 2003

Geração Windrush  

Designação da primeira vaga de imigrantes caribenhos em território britânico após a Segunda Grande Guerra Mundial. O nome deriva do navio SS Empire Windrush que transportou em 1948 os primeiros caribenhos, na sua maioria jamaicanos. Como termo, designa a migração caribenha em geral em direcção à Grã-Bretanha.

Mulato  

Mulato define literalmente um indivíduo cuja ascendência é mista, embora tradicionalmente se referisse à miscigenação de brancos e negros. O termo começou a ser contestado quando se tomou consciência da qualidade inerentemente racista das classificações científicas das “raças” que proliferaram no século XIX. O sentido discriminatório está bem patente na etimologia da palavra, “jovem mula” (vide OED), a qual remete para a animalização do indivíduo de paternidade mista e para o repúdio pela contaminação do sangue europeu pelo negro.

Lenda dos Noventa  

A partir da última década do século XIX começou a surgir uma noção de identidade nacional na Austrália que ficou conhecida como Lenda Australiana ou Lenda dos Noventa. A Lenda surgiu no seio da comunidade anglo-celta e por detrás dela estava o ímpeto de fomentar um espírito nacionalista que ambicionava acentuar o carácter especificamente australiano por oposição à britanidade. Os princípios advogados de igualdade, companheirismo (“mateship”), resistência à adversidade geográfica e anti-autoritarismo rapidamente se difundiram. O território do coração australiano, o mato (“bush”), tornou-se berço (de uma construção) de identidade nacional no qual homens fortes combatiam corajosamente a arduidade da terra e do clima, apoiando-se mutuamente com vista à sobrevivência. Composições exaltando este carácter, embora por vezes mais pessimistas, foram publicadas por A. B. (“Banjo”) Paterson, Joseph Furphy e Bernard O’Dowd que juntamente com Henry Lawson constituíram a base literária sobre a qual assentou a formação da nação durante o final do século XIX e início do século XX.

Oratura  

Como conceito que ambiciona equivaler a forma oral com o estatuto cultural que têm as formas escritas, nele está subjacente um desmantelamento de hierarquias. Incorpora ainda um valor de resistência na medida em que a escrita não só veio a representar uma marca da superioridade dos colonizadores, mas também foi utilizada como estratégia efectiva de dominação e apropriação/destituição territorial.

Yard  

Tipo de romance caribenho que o Grupo Beacon produziu nos anos de 1930. Escritores como Alfred Mendes e C.L.R. James faziam desenrolar a acção das suas obras nos quintais e espaços cercados (“yards”) dos subúrbios, onde grande parte da classe trabalhadora estabelecia os seus laços pessoais e sociais. Nos anos 50, outros trinitários recuperaram o estilo literário que cativou artistas de diversas partes das Caraíbas. Nas duas décadas seguintes Marina Maxwell promove uma experiência dramática, o Teatro Yard, que torna acessível este formato de produção cultural aos transeuntes jamaicanos.

Orientalismo   Termo de Edward Said, orientalismo define uma forma de pensamento, um exercício de autoridade, um conjunto de práticas e instituições afiliadas que constituem um discurso interdisciplinar (antropológico, etnográfico, económico, político e literário) presente na e construído pela consciência europeia do Oriente, tanto em termos geográficos como dos seus povos. Said identifica dois modos complementares de presença orientalista: orientalismo constitui uma distribuição de uma consciência geopolítica em textos estéticos, académicos, económicos, sociológicos, históricos e filológicos. O orientalismo é ainda uma elaboração de uma distinção geográfica entre Oriente e Ocidente, bem como o conjunto dos interesses que engendram e dão continuidade através de descobertas académicas, reconstituições filológicas, análises psicológicas e descrições da paisagem e dos elementos sociológicos.
palimpsesto  

No discurso pós-colonial, o termo define os modos através dos quais tanto as culturas pré-coloniais como a própria colonização formam um continuum que atravessa e constitui a identidade cultural das sociedades pós-coloniais. Apesar do efeito histórico acumulativo que cada período negoceia, incluindo apagamentos, todas as experiências do presente estão cunhadas com vestígios do passado os quais permanecem como parte do presente. Identificar esses indícios do passado é um passo determinante para compreender a constituição do presente.

Rizoma   Termo derivado da Botânica, “rizoma” é apropriado por Deleuze e Guattari para o campo da Filosofia. É daí que os Estudos Pós-Coloniais o recuperam. No contexto do colonialismo, “rizoma” descreve as relações em rede (rizomáticas) de influências de significado e poder. O conceito tem sido instrumental na revelação da complexidade do sistema colonialista já que tem permitido discuti-lo para além da aparente forma simplista de aplicação de estruturas monolíticas. Para além de uma estrutura hierárquica reconhecida, o colonialismo actua/va através de múltiplas relações promotoras de noções de hegemonia económica e cultural, repressão psicológica e cumplicidades de variados graus devido à natureza invisível dessas relações.
L(USA)lândia  

L(USA)lândia apareceu como parte do discurso sobre a diáspora portuguesa na obra ensaística de Onésimo Teotónio Almeida. O conceito que lhe subjaz remete para um território imaginário: um “país” ligado à lusitanidade, populado por luso-americanos e imigrantes portugueses nos Estados Unidos. A grafia singular do termo espelha adequadamente a realidade híbrida das várias comunidades portuguesas ou luso descendentes em questão.

Comprador  

O termo português é usado nos discursos em língua inglesa na sua forma original. No discurso marxista, aproveitando o sentido de intermediário entre os produtores estrangeiros e os negociantes locais, define a classe burguesa cujos rendimentos provêm de investimentos em mercados estrangeiros e que, por tal, contribuem activamente para que um sistema de lógica colonialista seja promovido. No discurso teórico dos estudos pós-coloniais o termo refere-se aos produtores de textos ensaísticos e artísticos influenciados ou aliados com o princípio colonial. 

sistema-mundo (teoria de)   Na década de 1970 Immanuel Wallerstein apresentou a teoria do sistema-mundo a qual continuou a desenvolver durante o resto da sua carreira. Com uma atitude que poderíamos de designar de anti-globalista, Wallerstein argumenta (e denuncia) que desde a instalação do mercantilismo no século XVI que o mundo é dominado por um sistema capitalista que determina os aspectos sociais e políticos. Rejeita, portanto, o desenvolvimento económico a nível individual e de escalamento: em termos de estado-nação e de estádios. A percepção de uma economia mundial conduz à reinterpretação de sistemas específicos que vão desde as políticas nacionais à etnicidade, sistemas condicionados por um macro sistema. Wallerstein reage assim aos princípios da teoria da modernização que se centra no conceito de estado-nação e pressupõe crescimento idêntico entre nações, descurando realidades históricas específicas e factores de transnacionalidade.
Mono-culturalismo anglo-celta  

Anglo-celta tem sido usado na Austrália para designar a população de ascendência britânica. Mono-culturalismo anglo-celta descreve o favorecimento que ocorre convencionalmente relativamente a essa população. O mono-culturalismo anglo-celta depreende ainda um grau de homogeneidade entre as distintas proveniências britânicas, no processo anulando as divisões entre os emigrantes ingleses e “celtas”, divisões essas naturalmente transferidas para os novos territórios e nas quais assentam as emanações locais. A lenda de Ned Kelly reflecte esta problemática e foi adoptada para a ficção em Our Sunshine (1991) de Robert Drewe e em True Story of Kelly Gang (2000) de Peter Carey.

Comunidade imaginada   O termo de Benedict Anderson enquadra a ideia de nação num contexto historicista. “Nação” e os nacionalismos são conceitos com fins económicos e políticos ditados por um fenómeno particular, a Modernidade e o capitalismo. A construção de “nação” é levada a cabo pelos membros que se incluem nesse grupo e que lhe atribuem características próprias. Apesar de disparidades internas e mesmo de desigualdades agudas, o sentido de nação prevalece através de um sentimento de fraternidade e afinidades partilhadas. Como construção cultural é relevante incluir no debate quem são os agentes produtores deste conceito colectivo bem como as representações e ideologias veiculadas pelos seus discursos.
Universidade de Aveiro    Fundação para a Ciência e Tecnologia    Departamento de Línguas e Culturas